Sofia olha o espelho: é lá que eu me (te) vejo

Venho acordando com uma ressaca braba. O engraçado e que há meses não bebo. Mais inconstantes do que minhas mudanças de humor, apenas as climáticas desta cidade. Ando descartando, por favor, anotem, o desagradável.
Escolho o disco. Tiro a roupa. Entro no banho. A água percorre todos os poros. Nenhuma parte resta seca. Neste exato momento, de intensa reflexão, a música pula. Arranhado, a canção repete arranhada Penso: vai passar, vai passar. Não passa. Saio, sem roupa, arrepiada, deixando um rastro de água. Passo para frente. Alívio. Passou.
Com outras, era baixo. Calmo. Comigo, sabes, jamais. Gritos te acordariam clamando desejosos. Sempre. Eu nunca durmo. Não te dou o que queres. Nunca. Pare de me pedir. Implorar já não tem graça. Atores de um grande show no qual somos todos os palhaços. Sociedade do espetáculo. O patetismo alheio não cobra entrada, entrem e fiquem à vontade. Inferior? Superior? Ninguém ganha nesse jogo. É apenas um.
Arrume a cama trinta e nove vezes para ver que outras duzentas e noventa e quatro terás vontade de desarrumá-la. Não coloque seus medos, expectativas, desilusões, desagrados e desafetos em mim. Já não pertences mais a esfera que um dia nos uniu. Assisto estupefata ao teatro da vida alheia. Já comprei meu ingresso. Participei com afinco, apreço, dedicação. Porque acreditei. Fazia parte de mim. Não sou meia entrada. Não me agarram pela metade. Tivesses o todo. Faz tempo, passou. Acho graça em tuas piadas, são apenas piadas. Sou outra, sendo a mesma. Tentas ser outro, devolvendo o meu mesmo. Comprovando exatamente o que eu já sabia: vamos brincar de como se?
Já te falei pelas metáforas.
Para que ser direto se posso complicar?
Quero chegar ao teu âmago.
Nas tuas entranhas.
No íntimo, estranho.
Lá sei que está a tua essência.
Esse ser normal eu desprezo.
Te largo solitária.
Minha companhia foi ilusória.
Bem o sabes.
Volte ao teu degredo.
Jamais te pediria perdão.
Estarei aqui, sempre.
Disposto a nada.
Para continuar a tua tortura.
Nunca respondendo as tuas questões.
Procure, sempre, o espelho.

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