Seres falíveis

Não quero ser eu. Quero ser um qualquer na vã tentativa de negar que sou esse ser humano falível que sofre e chora. Briga por aquilo que acredita. Exausta, no fim não quero mais brigar. O corpo paga pelo que a mente não agüenta. Está cansado e minguado. Já anda arqueado e quase alcança o chão. Quer cair. Cai. Falta ar. Tenta respirar, busca em seus pulmões algo que não sabe mais encontrar. Crê que nunca soube direito tragar de si a energia vital. Não desiste. Nunca se sentiu tão exausta. Sabe que falta pouco. Sabe-se sendo, mesmo não se entendendo muito bem. E nessa segue. Trôpega. Sugando de si a energia que não tem. Sem querer buscar nos outros. Percebe que talvez tenha exagerado. Sente-se desamparada por não poder também amparar quem perto de si está e precisa. Relações de troca o tempo todo. Quer que a ensinem a redescobrir os prazeres da vida, mesmo sabendo que isso só depende de si. Mas como pode fazê-lo se não crê em si. Nem no outro. Nem em ninguém. Anda desacredita de tudo. Na tentativa de não sentir, sente demasiado. E demasiada dor é o que sente. Porque o prazer não se permite. A garganta trava. Fecha. Bloqueia. Tem falta de ar. Pânico. Não pode ser feliz. A racionalidade dá respostas exatas. É aí que procura. Dorme na sua racionalidade e gera seus monstros. Acorda no seu transtorno e segue seu dia cercada pela prisão construída por suas próprias exigências. Ninguém é tão duro como ela mesma, exceto ela própria. Vê o que tem. É seu e real. Não acredita. Tudo que pode pegar não interessa. Não é perfeito. Volta correndo pra bolha. É lá que está confortável. O mundo real causa pânico. Não lhe deixa respirar. Ela quer sentir muito. Quer anestesia na veia. Quer ser uma princesa de conto de fadas. Que anda voando num cavalinho encantado. Sobrevoando. Olhando de cima. Não tendo que tocar. Experimentar dá medo. Achava que tinha experimentado, mas percebeu que poucas vezes de verdade. Quando tentava acabava por gritar, tão alto, tão alto, que realmente conseguia espantar quem consigo estava. Os poucos que ficaram conseguiram conhecê-la um pouco. Os muitos que correram a julgaram louca. Ela tem outro tempo. Universo paralelo. Vive em um filme frenético. Onde tudo acontece em duas horas. Acostumou-se. Já sabe que não pode mais. Já não é mais. Já sabe que berrar não adianta. Até porque não o faz mais com os outros. O problema é consigo. Quem está pagando é ela. Se formos sinceros vão achar que estamos mentindo. Se mentirmos, podemos soar sinceros, alguém ganha? Parece que tanto faz nesse jogo. A diferença é que quem sabe o que passa é quem age. Ou nem sempre, porque pode estar confuso demais. Estar por sua conta e risco é o que dói. Cara a cara com você mesmo. Sem muletas, encostos, máscaras, bandos. Isso é o que dói. Necessário pra trocar a carcaça, expulsar os demônios e conviver com os fantasmas. Todo mundo carrega piano nas costas e tem elefantes sentados no peito. Só que em alguns momentos eles se tornam pesados demais.

Comentários

Postagens mais visitadas