Seguindo seco

Viva de lendas, das suas, dos outros.
Sugue tudo o que for possível: assim não se sentirá cansado.
Esqueça as gentilezas, elas jamais foram passe para lugar algum.
Lugar algum tampouco existe.
Troque as fantasias por máscaras permanentes.
Esconda os dentes e mostre uma carranca.
Estanque tudo de fluido.
Não dê ouvidos: dê as costas.
Viva do passado.
Ande com seus pés virados para trás.
Aponte seus dedos na cara de quem não merece.
Ninguém faz por merecer.
Merecimento é o mérito dos tolos.
Busque a aprovação alheia.
Provando sua sanidade.
Veja se agüenta.
Doe seu tempo a causas inúteis.
Viva encaixando-se na dança.
Não saia dos conformes.
O perigo é de morte.
Ignore as regras
Jogue-se de cabeça.
Não esqueça que vai doer.
Segure o pranto e não deixe ninguém ver.
Olhe sempre por cima da cabeça alheia.
Veja longe, perto é verde demais.
No horizonte está o cinza.
Seguindo reto, sacando seco.
Enchendo o saco.
Entregue-se à monotonia borbulhante.
Trazida pelas ruas, pelas buzinas, pelos falantes.
Falam demais, qualquer coisa, o tempo todo.
Não calam a boca.
O silêncio é estridente.
Berra-se mais por não se saber ficar em silêncio do que por se querer falar.
Então fala-se qualquer coisa.
E qualquer coisa é falada.
O tempo todo.
Os ouvidos vão sendo entupidos.
Entulhados.
Transbordam lixo.
Ficam surdos.
Ficamos surdos.
De nós. Dos outros. Do mundo.

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